sexta-feira, 3 de dezembro de 2010

Sensações Fragmentos e Reflexos

Demorei um pouco para escrever sobre as sensações que tive ao fazer essa úlima performance do naipe - Fragmentos e Reflexos, talvez para digerir mesmo tudo que percebi.
Enfim, como foi uma intervenção em um espaço público. O imprevisto estava assumido.
Chegando no espaço para montagem da ação. Uma surpresa. Bem ao lado, um show com palco montado, caixas de som enormes...bandas....
Imaginem a interferência sonora, contando que tínhamos um músico convidado (ainda bem que ele usava guitarra e amplificador!!!)
Mas é isso aí!
Parque, espaço público...

Acabamos de montar nossa estrutura com ajudas de amigos (verdadeiros anjos nessas horas).
Trocamos de roupa e estávamos lá. Prontas e posicionadas.
Cada um com um canetão preto.
Eu num extremo do corredor de colunas e a Lara no outro.
Felipe Chagas, o músico, estava bem ao centro na lateral.

E nesse momento, imagina um silêncio interno para me concentrar na ação.
Porém escutava bastante a voz do vocalista da banda do show ao lado....
Como não sabia se era eu que não escuta a guitarra do nosso músico ou ele não tinha começado, resolvi começar a dar os primeiros passos, gestos...
Daí deu um alívio!
Comecei a escutar aquele som distorcido que tanto almejava escutar da guitarra.
Meu ombro respondeu com um gesto naquele exato momento.

E assim começou de fato a se modificar o clima daquele espaço.
Algo surgiu.
Famílias, crianças, casais, vendedores ambulantes, cada um em seu tempo de curiosidade, foram se aproximando.
Aquele primeiro momento da ação representava para mim um período de marcas deixadas pelo caminho e tentativas de construir algo. Tentativas, porque, em algumas momento o que estava sendo construído se interrompe. Se torna confuso, quero ir para algum lugar e não sei onde.
Quero fazer algo e não sei o quê. Aflição, agonia...até chegar na hora de se deparar com o problema de fato.

Nessa primeira fase, então, eu já tinha pré estabelecido uma estrutura de movimentos e gestos.
Mas estando ali, com aquela energia, aquelas colunas...me aguçaram a explorar e ousar mais e mais. E fazer de determinadas situações do acaso, algo que acrescentasse no trabalho.
E foi assim, nessa fase de "tumulto" da ação um bêbado passou pelo meio do corredor fascinado pelo som da guitarra e quase me atropelou, nem me viu, e fiz disso algo que interferiu no meu movimento, saí dando voltas quase encostando nele tb...como uma folha que voa ao vento...
Outra situação foi quando uma menina de uns 5 anos de idade se aproximou enquanto eu desenhava no segundo vidro. Ela olhava para o desenho que se formava e como meu gesto estava sendo influenciado pela música da guitarra. Não podia continuar como se ela não estivesse ali.
Virei bem o vidro pra ela enquanto continuava os últimos traços.
Cada vidro que balançava com o vento interferia em como meu corpo se mexia.
Por vezes andei em círculos sem saber qual vidro iria explorar.
Me apoiei nas colunas como forma de me segurar...
Movimentos quebrados, torcidos, contração...

Cheguei no centro do corredor.
O grande vidro estava ali. Pendurado.
No chão a lona de tecido. Potes com tinta. Pincel. Batom preto
A guitarra silenciou.

Eu e a Lara nos olhamos.
Seguramos o vidro para parar de girar.
Pincel na mão e começamos a molhar com tinta branca e pintar o vidro.
Nesse segundo momento. Juntou muita gente. Concentração naquele centro do espaço.
Para mim, essa fase simboliza muito o enfrentamento de frente de aluma situação.
Apagar, desapegar, desfazer....
Estávamos apagando nosso reflexo naquele vidro e já não nos víamos mais.
Mas chegava a hora de romper tudo.
E precisávamos de uma tesoura.
ahh tesoura.

Esse foi outro fato do acaso.
A tesoura não estava a postos.
Foi então que o uso da palavra fez parte da ação e quebrou com o ritual de nosso silêncio reagindo apenas através de movimentos do corpo.
Soltei o verbo com vontade e assumi a sensação de desespero que me tomava.
E falei alto.
- Alguém me alcança a tesoura!
nada...
- Alguém me alcança a tesoura faz favor! Eu preciso cortar isso daqui!!!
e minha mãe se movimentou atravessando o corredor até chegar nos materiais recostados ao lado do músico e me alcançou.

Sim! Agora eu podia cortar e romper com o fio de náilon que sustentava aquele vidro.
Aquela barreira divisória.
Para mim, foi bem simbólico minha mãe me trazer a tesoura para tirar aquilo do caminho.
Enfim.
Ao cortar o fio, eu e a Lara deitamos o vidro sobre o tecido.
Enrolamos e cobrimos.
Uma de frente para outra.
Começamos aos poucos a caminhar por cima do vidro embalado.
Aos poucos vai se quebrando, barulhos de estilhaços realçados por um microfone posionado com efeito com eco...
E seguimos, passando por cima do "problema" sem se machucar.
Protegidas pelo tecido.

Agora uma de costas para outra olhamos para o resto do corredor a percorrer.
Seguramos nesse momento o batom preto.

O som da guitarra reaparece com harmonia em sua melodia.
E a sensação agora para mim é de um grande alívio.
Meu rosto já não carrega mais um ar pesado e confuso.
Mas sim uma leveza.
Meu primeiro movimento foi circular com a cabeça.
Relaxando.
Um certo sorriso, começava a surgir.
Meu caminhar agora já seguia movimentos mais longos...
Mais lentos...
Meu ritmo já não alterava tanto.
Meus braços balançavam de um lado para outro despreocupados.
Realmente na busca de um equilibrio.
Os desenhos não ficam regsitrados nos lugares em que passo, mas em mim também.
E vou me aproximando de cada vidro desenhado.
Um universo com um novo olhar, com outras marcas, outras possibilidades.
O primeiro desenho que fiz na minha pele foi direto no meu rosto.
Depois na perna...braços...

Percebo que percorri meu caminho.
O som da guitarra continua.
Não olho para trás.
Resolvo seguir pelo parque agora.
Com um caminhar extremamente leve e tranquilo.
Estou sorrindo para as pessoas que passam.
E de canto de olho percebo 3 crianças que me seguem.
Estamos no meio de algumas árvores e derepente me vejo tomada de vontade de interagir com elas. Vou num pulo para trás de uma árvore. Ouço risadas.
Em seguida corro para trás de outra. Mais risadas e agora elas realmente correm na inha direção.
E começamos nossa brincadeira.
Corria corria e quando eu parava colocava os braços pra cima e elas me abraçavam.

Não podia ter um final melhor para mim.
Estar em contato direto com energias novas e puras.
Depois de atravessar um corredor vivenciar esse último momento com elas foi praticamente
encontrar a luz.
Talvez tenha exagerado.
Mas fiquei extremamente realizada com a performance.
Situações ocorreram do acaso de forma a acrescentar a ação.

Agradeço imensamente, em meu nome e no nome do grupo naipe, todos que puderam prestigiar e compartilhar do trabalho.

Ass. Mariana Konrad

3 comentários:

  1. adorei a descrição da performance...não estive lá no dia...infelizmente. Mas pelo modo que contaram me senti participando.

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  2. Belas fotos e descrição! Fazer perfomance é assim, tem que improvisar! Na última que fiz, acabei acrescentando movimentos que surgiram no momento, vindos de uma inspiração das pessoas e do local! Parabéns!

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  3. Mari e Lara!
    Me sinto muito feliz em ter participado da performance e ao ler o texto pude reviver aquele momento. A performance de vocês incentiva e é significativa para quem não conhece esta arte. Continuem. E me chamem!

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